domingo, 27 de novembro de 2016

Gregório de Matos



Trecho extraído do site https://www.ebiografia.com, seguido de observações dos alunos Denicio Martins e Matias Magariños

Gregório de Matos (1636-1695) foi um poeta brasileiro. Desenvolveu uma poesia lírica e religiosa, mas se destacou por sua poesia satírica, recebendo o apelido de "Boca do Inferno".
Gregório de Matos (1636-16965) nasceu em Salvador, Bahia, no dia 23 de dezembro de 1636. Filho de pai português e mãe baiana, frequentou o Colégio da Companhia de Jesus. Foi estudar na Universidade de Coimbra. Em 1661 já está casado e formado em Direito. Neste mesmo ano, é nomeado juiz em Alcácer do Sal, no Alentejo. Volta à Salvador, nomeado procurador da cidade, junto a corte portuguesa.
Além de grande poeta, fez também um trágico retrato da vida e da cultura baiana do século XVII. Como não havia imprensa no Brasil Colônia, seus poemas tiveram circulação escrita e oral. Sua produção poética pode ser dividida em três linhas: satírica, lírica e religiosa. Seus poemas líricos e religiosos revelam influência do barroco espanhol. Sua poesia satírica é do tipo que ataca, sem compostura, toda a sociedade baiana, da qual ele se sentia um censor e uma vítima. Por suas críticas ferinas, recebeu o já citado apelido de "Boca do Inferno".
Em 1694, por suas críticas violentas e debochadas às autoridades da Bahia, é degredado para Angola. Em 1695 recebe permissão para voltar ao Brasil, mas não para a Bahia. Vai viver na cidade do Recife.
Gregório de Matos Guerra morreu no Recife, no dia 26 de novembro de 1695.
Gregório nada publicou em vida. A totalidade de sua obra se manteve inédita, até quando Afrânio Peixoto a reuniu em 6 volumes, publicados no Rio de Janeiro, pela Academia Brasileira de Letras, entre 1923 e 1933, sob o título de "Obras de Gregório de Matos".
Vale lembrar a constante dúvida que acompanha a vida e obra do autor, se ele realmente existiu ou não. Por diversos motivos somos levados à, pelo menos, questionar sua existência, tanto pela grande variedade de obras que são assinadas pelo nome “Gregório de Mattos”, quanto pela diversidade de estilos presentes nestas obras. A saber, poesia lírica, religiosa e satírica.
Será ele um escritor genial, que com sucesso transitou por diversos estilos? Ou, talvez, um coletivo de poetas que, devido ao caráter de algumas de suas obras, se utilizavam de um pseudônimo? Ou ainda, algo menos grandioso, como um entre infinitos eventos que ao longo da história não se mostraram precisos, e, como as águas do mar, em muito atiçam o inconsciente dos que se colocam a observar e refletir o passado...  citando Oliveira: Trata-se de uma espécie de solução encontrada pela crítica para o problema da autoria dos textos que hoje são atribuídos ao autor. De fato, três fatores nos levam a questionar se estes realmente foram escritos por Gregório de Matos. Em primeiro lugar, não há notícia de texto autografado do autor, nem de trabalho impresso em vida. Além disso, as condições de circulação dos poemas na época, através da oralidade ou por meio de folhas avulsas em que se copiavam textos da mais variada natureza, apontam para a possibilidade de se lhe terem atribuído produções alheias. (Cf. Oliveira, 2003: 33; Moreira, 205: 123).”
Outra característica a ser criticada é até que ponto podemos fazer uma real análise da sociedade na qual estava inserido, a saber: Bahia do séc. XVII, com base em sua obra. Uma prática muito comum aos poetas desse período é a emulação. Trata-se da imitação de autores clássicos, tidos como referência e considerados autoridades na arte poética. Logo, não é de se surpreender que o autor dessas obras simplesmente tenha imitado a tradição, tirando muito do caráter de “verdade histórica” de sua obra. Um outro ponto significativo da "suposta" biografia de Gregório, foi o fato de ele ter sido destituído de seus encargos coloniais pela igreja por se negar a usar a batina.
Também muito fiel à tradição, o autor principiou uma promissora carreira administrativa na corte portuguesa, porém, manteve suas críticas à corte e, após diversas tentativas de realocá-lo em algum órgão, acabou por ser expulso da igreja e deportado para Angola, proibido de voltar para a Bahia. Depois de uns anos, ganha a liberdade de voltar para o Brasil, e morre em Recife, vítima de febre, ainda sem poder voltar a Bahia.

 Gregório de Matos (2).gif

Poemas

Define sua cidade

Mote

De dois ff se compõe
esta cidade a meu ver:
um furtar, outro foder.

Recopilou-se o direito,
e quem o recopilou
com dous ff o explicou
por estar feito, e bem feito:
por bem Digesto, e Colheito
só com dous ff o expõe,
e assim quem os olhos põe
no trato, que aqui se encerra,
há de dizer que esta terra
de dous ff se compõe.

Se de dous ff composta
está a nossa Bahia,
errada a ortografia,
a grande dano está posta:
eu quero fazer aposta,
e quero um tostão perder,
que isso a há de perverter,
se o furtar e o foder bem
não são os ff que tem
Esta cidade ao meu ver.

Provo a conjetura já,
prontamente como um brinco:
Bahia tem letras cinco
que são B-A-H-I-A:
logo ninguém me dirá
que dous ff chega a ter,
pois nenhum contém sequer,
salvo se em boa verdade
são os ff da cidade
um furtar, outro foder.

Gregório de Matos (1).gif

Comentário: Vemos nesse poema, que pertence ao estilo satírico, uma clara crítica à situação social da Bahia. A aparente degradação social, no ponto de vista do autor, aparece como uma consequência da ascensão social dos negros, efeito da transição do eixo econômico da produção açucareira para o comércio portuário. A adoção de costumes diferentes dos implantados pelas oligarquias latifundiárias - oligarquias essas às quais pertencia a figura de Gregório de Matos - causou uma maior liberdade social na Bahia do séc. XVII. Apesar de não podermos tomar esses poemas como um documento de análise histórica da sociedade baiana - inclusive uma análise mais detalhada demonstra que tal transição de fato não ocorreu, tendo em vista que os portugueses continuavam tendo em suas mãos o poder econômico - por conta do processo de emulação acima citado, vale observar que algum fundo de verdade há nestas poesias, pois pertencem à tradição satírica tais maneiras de criticar, mesmo que não tenham valor crítico.
Outro poema que apresenta uma forte “crítica” social, é o poema de “Dona Cota”, apresentado abaixo:

A mesma Maria Viegas sacode

agora o poeta extravagantemente

porque se espeydorrava muito


Dizem, que o vosso cu, Cota,
assopra zombaria,
que aparece artilharia,
quando vem chegando a frota:
parece, que está de aposta
este cu a peidos dar,
porque jamais sem parar
este grão-cu de enche-mão
sem pederneira, ou murrão
está sempre a disparar.
De Cota o seu arcabuz
apontado sempre está,
que entre noite, e dia dá
mais de quinhentos truz-truz:
não achareis muitos cus
tão prontos em peidos dar,
porque jamais sem parar
faz tão grande bateria,
que de noite, nem de dia
pode tal cu descansar.
Cota, essa vosso arcabuz
parece ser encantado,
pois sempre está carregado
disparando tantos truz:
arrenego de tais cus,
porque este foi o primeiro
cu de Moça fulieiro,
que tivesse tal saída
para tocar toda a vida
por fole de algum ferreiro.

Gregório de Matos (3).gif

Comentário: Uma vez mais, podemos observar fortes críticas sociais neste poema satírico. Apresentando um vocabulário de bastante baixo calão e trazendo como tema do poema o cotidiano do povo, características reconhecidas como tradições da poesia satírica, sempre respeitada pelo autor.
Para contrastar um pouco com esses 2 poemas, o que se segue é de poesia religiosa.

Ao braço do mesmo Menino Jesus

quando appareceo.

O todo sem a parte não é todo,
A parte sem o todo não é parte,
Mas se a parte o faz todo, sendo parte,
Não se diga, que é parte, sendo todo.
Em todo o Sacramento está Deus todo,
E todo assiste inteiro em qualquer parte,
E feito em partes todo em toda a parte,
Em qualquer parte sempre fica o todo.
O braço de Jesus não seja parte,
Pois que feito Jesus em partes todo
Assiste cada parte em sua parte.
Não se sabendo parte deste todo,
Um braço, que lhe acharam, sendo parte,
Nos disse as partes todas deste todo.

Comentários: bastante diferente dos dois acima, não é? Este texto corresponde ao estilo religioso, uma pequena indicação da possibilidade de serem mais de um autor, pelos muito diferentes estilos de escrita. Este poema fala sobre um evento que ocorreu quando um pedaço - braço - de uma estátua do menino Jesus foi roubada. Aqui o autor faz uma bela análise da concepção religiosa da época, explicitando a forte relação dos santos e suas representações com a fé popular. Mais uma vez, fica bastante clara a ideia de emulação, dessa vez referente a tradição barroca. O jogo com palavras, o enorme esforço de adornar belamente o poema, a dicotomia parte-todo (luz-sombra), bastante evidente neste trecho: Não se sabendo parte deste todo, Um braço, que lhe acharam, sendo parte, Nos disse as partes todas deste todo. São características reconhecidas da tradição barroca, que aqui o autor sabiamente respeita.
Segue mais um poema desta tradição religiosa atribuída a Gregório de Matos.

A Christo S. N. crucificado estando

o poeta na última hora de sua vida

Meu Deus, que estais pendente em um madeiro,
Em cuja lei protesto de viver,
Em cuja santa lei hei de morrer
Animoso, constante, firme, e inteiro.
Neste lance, por ser o derradeiro,
Pois vejo a minha vida anoitecer,
É, meu Jesus, a hora de se ver
A brandura de um Pai manso Cordeiro.
Mui grande é vosso amor, e meu delito,
Porém pode ter fim todo o pecar,
E não o vosso amor, que é infinito.
Esta razão me obriga a confiar,
Que por mais que pequei, neste conflito
Espero em vosso amor de me salvar.
Comentário: mais uma vez se apresenta neste poema de estilo religioso os marcantes traços barrocos. O rebuscamento, a dualidade das palavras e idéias - claramente observado no trecho, Porém pode ter fim todo o pecar, E não o vosso amor, que é infinito., na penúltima estrofe. O tema do tempo, o conflito entre o corpo e a alma, o eu lírico se apresentando como pecador, a espera da redenção, são alguns dos traços marcantes desse gênero poético. Muito de acordo com a tradição nos apresenta o autor esse poema. afirmando uma vez mais a riqueza da obra de Gregório de Mattos.
Seguem dois poemas do um terceiro ramo literário que também muito habilmente trabalhou o autor, os poemas líricos.

Pondera agora com mais attenção

a formosura de D. Angela.


Não vi em minha vida a formosura,
Ouvia falar nela cada dia,
E ouvida me incitava, e me movia
A querer ver tão bela arquitetura.
Ontem a vi por minha desventura
Na cara, no bom ar, na galhardia
De uma Mulher, que em Anjo se mentia,
De um Sol, que se trajava em criatura.
Me matem (disse então vendo abrasar-me)
Se esta a cousa não é, que encarecer-me.
Sabia o mundo, e tanto exagerar-me.
Olhos meus (disse então por defender-me)
Se a beleza hei de ver para matar-me,
Antes, olhos, cegueis, do que eu perder-me.

Comentário: neste poema do gênero lírico, o tema central é a beleza da mulher e o sofrimento amoroso. O amor, não correspondido, é doloroso e cruel, tanto que o autor afirma preferir ficar cego, para não ver mais a mulher, do que se entregar a este sentimento. Assim como as tradições dos outros gêneros são respeitados também é esse.

Rompe o Poeta Com a Primeira

Impaciência Querendo

Declarar-se e Temendo

Perder Por Ousado



Anjo no nome, Angélica na cara,
Isso é ser flor, e Anjo juntamente,
Ser Angélica flor, e Anjo florente,
Em quem, senão em vós se uniformara?

Quem veria uma flor, que a não cortara
De verde pé, de rama florescente?
E quem um Anjo vira tão luzente,
Que por seu Deus, o não idolatrara?

Se como Anjo sois dos meus altares,
Fôreis o meu custódio, e minha guarda,
Livrara eu de diabólicos azares.

Mas vejo, que tão bela, e tão galharda,
Posto que os Anjos nunca dão pesares,
Sois Anjo, que me tenta, e não me guarda.

Gregório de Matos (4).gif

Comentário: esse poema, também da tradição lírica, apresenta características um pouco diferentes do anterior, algo menos melancólico - digamos. Aqui, a mulher comparada a um anjo - Anjo no nome, Angélica na cara - também se apresenta com um belo corpo de mulher, atiça o amor carnal do poeta. Nesse poema, o autor não sugere autoflagelar-se por sentir desejo, quase que o compara a devoção.  

Agora, seguem alguns trechos do livro “história concisa da literatura Brasileira, de Alfredo Bosi”.

“No Brasil, houve ecos do barroco durante os séculos XVII e XVIII: Gregório de Mattos, Botelho de Oliveira, Frei Itaparica e as primeiras academias repetiram motivos e formas do barroquismo ibérico e italiano.
Na segunda metade do século XVIII porém, o ciclo do ouro já daria um substrato material à arquitetura, à escultura e a vida musical, de sorte que parece lícito falar de um “barroco brasileiro”, e até “mineiro”, cujos exemplos mais significativos foram alguns trabalhos de Aleijadinho, Manuel da Costa Ataíde e composições sacras de Lôbo de Mesquita, Marcos Coelho e outros ainda mal identificados.”
“Poesia muito mais rica, a do baiano Gregório de Matos Guerra (1623 - 1696), que interessa não só como documento da vida social dos Seiscentistas, mas também pelo nível artístico que atingiu.
Gregório de Matos era homem de boa formação humanística, doutor in utroque jure pela universidade de Coimbra: mazelas e azares tangeram-no de Lisboa para a Bahia quando já se abeirava os cinquenta’anos; mas entre nós não perdeu, antes espicaçou o vezo de satirizar os desafetos pessoais e políticos, motivo de sua deportação para Angola de onde voltou, um ano antes de morrer, indo parar em recife que a sua última morada.
Têm-se acentuado os contrastes da produção literária de Gregório de Matos: a sátira mais irreverente alterna com a contradição do poeta devoto; a obscenidade do capadócio (José Veríssimo) mas se casa com a pose idealista de alguns sonetos petrarquizantes. Mas essas contradições não devem intrigar quem conhece a ambiguidade da vida moral que servia de fundo a educação ibérico-jesuítica. o desejo do gozo e da riqueza são mascarados formalmente por uma retórica nobre e moralizante, mas afloram com toda brutalidade nas relações com as classes servis que delas saem aviltadas. Daí o “populismo” chulo que irrompe às vezes , longe de significar uma atitude anti aristocrática, nada mais é que válvula de escape para velhas obsessões sexuais ou arma para ferir os poderosos invejados.Conhecem-se as diatribes de Gregório contra algumas autoridades da colônia, mas também palavras de desprezo pelos mestiços e de cobiça pelas mulatas. A situação de“intelectual” branco não bastante prestigiado pelos maiores da terra ainda mais lhe pungia o amor-próprio e o levava a estiletar às cegas todas as classes da nova sociedade.”
Araripe Júnior, no estudo que dedicou a Gregório, deixou claro que o tipo de comicidade peculiar ao sátiro baiano é o oposto a “alegria gaulesa” de Rebelais, tolerante no seu descansado epicurismo. “Nada disso se encontra em Gregório de Matos. Pessimismo objetivo, alma maligna, caráter rancoroso, relaxado por temperamento e costumes, o poeta do “marinícolas” verte fel em todas as suas sátiras; e, apesar de produto imediato do meio em que viveu, desconhece a sua cumplicidade, pensa reagir quando apenas o traduz, cuida moralizar quando apenas se enlameia”
“A truculência do juiz é a outra face do trovador obsceno: contraste primário que, dada a mediania humana e artística de Gregório, não deságua no eros religioso atingido pela alta poesia barroca de Tasso e Donne, Silesius e Sor Juana Inés de la Cruz.”
“Resta ver a força artesanal que é patente em um versejador hábil como Gregório. Alguns de seus sonetos sacros e amorosos transpõem com brilho esquemas de Góngora e de Quevedo e valem como exemplos de gosto seiscentista de compor similes e contrastes para enfunar imagens e destrinçar conceitos.”

Bibliografia:
“História concisa da literatura Brasileira; Alfredo Bosi” editora cultrix. 1975. São Paulo.
comentário extraído do site:  https://www.ebiografia.com, trechos do filme intitulado “Gregório de Matos”, de Ana carolina. 2002.

Um comentário:

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