Grupo: Pedro Paulo e Rubens Correia
Biografia:
José Basílio da Gama nasceu em oito de abril, de 1741, no
então arraial de São José do Rio das Mortes, hoje cidade de Tiradentes, em
Minas Gerais. Aos 16 anos, Basílio ingressou no Colégio dos Jesuítas no Rio de
Janeiro. Concluiu o noviciado e fez os primeiros votos para ser padre jesuíta e
pertencer ao quadro da Companhia de Jesus. Pertencer a tal Ordem significava
fazer parte de uma elite intelectual e política, visto que os jesuítas
dominavam a educação em Portugal. Em 1759, os jesuítas foram expulsos da pátria
portuguesa, como parte de um processo de modernização do país protagonizado por
Sebastião José de Carvalho e Melo (o Marquês do Pombal), e Basílio pode ter se
desligado da Companhia para evitar problemas. Entre 1762 e 1764 passa a viver
na Itália (Roma), onde frequentou os mais sofisticados circuitos literários. É
admitido, como o único brasileiro, na prestigiosa Arcárdia Romana e adota o
pseudônimo pastoril de Termindo Sipílio. Em 1768, por decreto, vai para
Portugal, onde é preso, sob a ameaça de exílio em Angola, por suas ligações com
os jesuítas. Para escapar de tal infortúnio, escreve um poema (Epitalâmio da
excelentíssima senhora dona Maria Amália), em louvor ao casamento da filha do
todo-poderoso Marquês do Pombal, mas com um comentário positivo das virtudes do
pai da noiva e de sua ação renovadora em Portugal.
Principais obras:
- Epitalâmio às Núpcias da Senhora Dona Maria Amália - 1769
- O Uraguai - 1769
O Uraguai, poema épico de
1769, critica drasticamente os jesuítas, antigos mestres do autor Basílio da
Gama. Ele alega que os jesuítas apenas defendiam os direitos dos índios para
serem eles mesmos seus senhores. O enredo situa-se todo em torno dos eventos
expedicionários e de um caso de amor e morte no reduto missioneiro. Utilizando a Guerra
Guaranítica como tema histórico, Basílio da Gama coloca a culpa do massacre
indígena nos jesuítas.
Tema central: Pelo Tratado de
Madri, celebrado entre os reis de Portugal e de Espanha, as terras ocupadas
pelos jesuítas, no Uraguai, deveriam passar da Espanha a Portugal. Os
portugueses ficariam com Sete Povos das Missões e os espanhóis, com a Colônia
do Sacramento. Sete Povos das Missões era habitada por índios e dirigida por
jesuítas, que organizaram a resistência à pretensão dos portugueses. O poema
narra o que foi a luta pela posse da terra, travada em princípios de 1757,
exaltando os feitos do General Gomes Freire de Andrade. Basílio da Gama dedica
o poema ao irmão do Marquês de Pombal e combate os jesuítas abertamente.
Quanto ao gênero épico: O Uraguai contém os elementos essenciais do formalismo
épico: proposição, inovação, dedicatória, narração, falas de personagens,
retrospecção e maravilhoso. Formalmente diferencia-se, porém, de um modelo
acabado de epopéia, por conter apenas cinco segmentos em oposição aos
tradicionais dez segmentos de um poema épico, pela ausência de esquematismo
rítmico e falta de recurso à mitologia com seus personagens sobre-humanos
(deuses, monstros, etc). Quanto ao sentido do poema, o espírito da poesia épica
está completamente ausente.
Apesar de O Uraguai trabalhar
um fato histórico, característica ideológica do gênero épico, falta o
distanciamento temporal necessário entre o autor e o assunto tratado, o qual
era um acontecimento recente, portanto, imune ao clima de idealização requerido
pelo gênero.
Na epopéia, o herói-protagonista lidera e conduz toda a ação, sobressaindo-se
por sua bravura, altivez e estatura moral. Em O Uraguai, percebe-se a indecisão
do autor em atribuir perfil heroico ora ao Capitão Português, ora aos índios
Cacambo e Sepé.
[...] Um frio susto corre pelas veias
De Caititu, que
deixa os seus no campo;
E a irmã por entre
as sombras do arvoredo
Busca co’a vista, e
teme de encontrá-la.
Entram enfim na
mais remota e interna
Parte de antigo
bosque, escuro e negro,
Onde ao pé de uma
lapa cavernosa
Cobre uma rouca
fonte, que murmura,
Curva latada e
jasmins e rosas.
Este lugar
delicioso e triste,
Cansada de viver,
tinha escolhido.
Para morrer a
mísera Lindóia.
(GAMA, Basílio. O Uraguai)
Nesse Canto, é encontrado o mais famoso acontecimento da obra, e talvez, da escola literária do Arcadismo.
Trata-se da morte de Lindóia, uma passagem bela, pela riqueza de detalhes, no
entanto fúnebre e melancólica. Nota-se nesse trecho uma característica que será
desenvolvida no Romantismo, ou seja, é uma antecipação de uma típica heroína
romântica, que prefere a morte à renegação do amor puro e verdadeiro. O seu adormecimento na caverna, a serpente que se enrola no seu
corpo, o bosque, a escuridão e a fonte murmurante são autênticos prelúdios do
mal do século, segunda fase romântica. Os jasmins e as rosas fazem parte
do cenário preparado para a sua morte.
[...]Tem por despojos cabeludas peles
De ensanguentados e famintos lobos e fingidas raposas.
Estes versos vêm logo após os que chamam Pombal de "Gênio de
Alcides", numa analogia com o descendente de Alceu, que vem a ser
Hércules, o grande herói da mitologia grega. E logo a seguir, no fragmento
transcrito acima, diz quais são os restos de guerra destinados ao herói: as
peles das raposas e dos lobos, ou seja, dos jesuítas.
Resumo da narrativa:
O poema é dividido em cinco cantos, contrariando o
esquema clássico-camoniano de dez cantos:
CANTO I
Saudação ao General Gomes Freire de Andrade. Chegada de
Catâneo. Desfile das tropas. Andrade explica as razões da guerra. A primeira
entrada dos portugueses, enquanto esperam reforço espanhol.
CANTO II
Partida do exército luso-castelhano. Soltura dos índios
prisioneiros, Sepé e Cacambo vêm parlamentar. Não chegam a um acordo. Atos
valorosos dos índios.
CANTO III
O General acampa às margens de um rio. Do outro lado
Cacambo descansa e sonha com o espírito de Sepé. Este incita-o a incendiar o
acampamento inimigo. Cacambo atravessa o rio e provoca o incêndio. Depois,
regressa para a sede. Surge Lindóia. Balda prende Cacambo e o mata. Tanajura
propicia visões a Lindóia: a índia “vê” o terremoto de Lisboa, a reconstituição
da cidade por Pombal, a expulsão dos jesuítas.
CANTO IV
Maquinações de Balda. Pretende entregar Lindóia e o comando dos indígenas a
outro. O episódio mais importante: a morte de Lindóia. Para não se entregar a
outro homem, deixa-se picar por uma serpente. Os padres e os índios fogem da
sede, não sem antes atear fogo em tudo. O exército entra no templo.
CANTO V
Descrição do Templo. Perseguição aos índios. Prisão de
Balda. O poeta dá por encerrada a tarefa e despede-se.
Embora tenha alterado os dados históricos, o próprio
poeta deixa transparecer sua simpatia para com os índios. Na verdade, isto tudo
se deu através de seus objetivos na obra: um general português a celebrar e
Jesuítas a denegrir. Os índios eram apenas algo que servia de pretexto para
concretizar tais propósitos.
Por ter o autor banhado o poema em um lirismo terno ou heroico, obviamente,
obteve-se a louvação do índio, mas, incorporando-se no Cacambo, para expor
todos os seus sentimentos e suas emoções, enfim, todo o seu romantismo.
Nota-se também, ao citar a natureza, que o autor a descreve com um paisagismo
romântico, tornando íntima a relação dos sentidos com o mundo.
Mas ainda se percebe, na obra, o lirismo expressado através de raiva, dor,
piedade, horror, etc., vividas pelos personagens ou pelo narrador, onde a
linguagem é voltada para si mesma, mais do que sobre o assunto de que fala.
Portanto, Basílio da Gama rompe, em O Uraguai, com a tradição do poema épico,
abandonando as referências mitológicas e preferindo a temática do “fetichismo
indígena”, tornando-se o primeiro proto “indianista”.
Apreciação crítica:
O poema é escrito em decassílabos brancos, sem divisão em
estrofes, mas é possível perceber a sua divisão em partes: proposição,
invocação, dedicatória, narrativa e epílogo. Abandona a linguagem mitológica,
mas ainda adota o maravilhoso, apoiado no fetichismo indígena. Foge, assim, ao
esquema tradicional, sugerido pelo modelo imposto em língua portuguesa, Os
Lusíadas. Por todo o poema, perpassa o propósito de crítica aos jesuítas, que
domina a elaboração do poema.
Apesar de trabalhar um tema pouco propício e insuficiente
para a produção de um poema épico (a luta armada para expulsar Jesuítas e
indígenas de suas terras é vista mais como um ato de covardia e injustiça do
que como uma ação heroica), Basílio da Gama consegue criar uma obra de fôlego e
elegância poética, de grande apelo visual nas suas cenas descritivas, numa
colorida paisagem cinematográfica.
O Uraguai é considerado o melhor poema narrativo do período neoclássico brasileiro,
abrigando alguns traços que antecipam o Romantismo. O equilíbrio entre a
história e a ficção, a linguagem solta, próxima do coloquial, mas cheia de
lirismo em muitas passagens inesquecíveis e o ritmo suave distinguem O Uraguai,
entre tantos clássicos de leitura penosa, pelo prazer que ainda pode
proporcionar ao leitor contemporâneo.
Bibliografia:
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