Biografia:
Escritor
e poeta do arcadismo brasileiro nascido em Vila Rica, capitania de
Minas Gerais, que ao lado do perfeccionismo dos versos, transmitiu em
sua arte poética um sentimento que o distinguiu dos demais árcades
mineiros. Mestiço e pobre, filho bastardo do músico Inácio da
Silva Alvarenga, com a ajuda de amigos, aos dezenove anos foi estudar
Humanidades no Rio de Janeiro, e depois de dois anos foi para a
Portugal iniciar estudos superiores na Universidade de Coimbra
(1771). Lá conheceu e fez amizades com intelectuais como Basílio da
Gama e Alvarenga Peixoto e acompanhou a intensa atividade intelectual
numa época em que o marquês de Pombal efetuava a reforma do ensino,
quebrava a tradição escolástica dos jesuítas e combatia a
nobreza. Filiou-se à Arcádia Ultramarina, com o nome de Alcindo
Palmireno e publicou o poema O desertor (1774).
Concluiu
seu curso (1776), publicou O templo de Nepturno (1777), escrito em
honra da aclamação de D. Maria I, e regressou ao Rio de Janeiro
(1777). Começou a exercer a advocacia no Brasil e abriu um curso de
retórica e de poética (1782) e foi nomeado professor régio por
Luís de Vasconcelos e Sousa, vice-rei. Sob o governo do Marquês do
Lavradio, protetor das ciências e das artes, tornou-se membro da
Sociedade Científica do Rio de Janeiro. Ainda patrocinado por
Vasconcelos e Sousa, abriu a Sociedade Literária do Rio de Janeiro
(1786), que logo transformou-se em clube de idéias democráticas.
Acusado de cultuarem as idéias revolucionárias francesas e de
subversão contra a Coroa portuguesa, por denúncia do frei Raimundo
e do rábula José Bernardo da Silveira Frade, foi preso a mando do
Conde de Resende, então vice-rei, que determinou o fechamento da
Sociedade Literária do Rio de Janeiro e o encarceramento dos seus
sócios.
Permaneceu
no cárcere dois anos e oito meses, sujeito a rigorosa e humilhante
devassa, confiada ao juiz Antônio Diniz da Cruz e Silva, que já
servira na devassa da Inconfidência Mineira. Posto em liberdade
(1797) por ordem de d. Maria I, ante a falta de provas concludentes
para a sua condenação, publicou a primeira edição de Glaura:
Poemas eróticos, na Oficina Nunesiana, Lisboa (1799). Voltou a
ensinar e colaborou (1813), juntamente com o seu companheiro da
Sociedade Literária do Rio de Janeiro, Mariano José Pereira da
Fonseca, futuro marquês de Maricá, em O Patriota (1813-1814). Com a
fundação de O Patriota, tornou-se um dos primeiros jornalistas
brasileiros. Faleceu em 1° de novembro, no Rio, solteiro, sem deixar
descendentes. Outras publicações importantes foram Desertor das
Letras (1774 ), A gruta americana (1779) e o poema Às artes (1788) e
a segunda edição de Glaura: Poemas eróticos (1801) na Oficina
Nunesiana, Lisboa.
Silva
Alvarenga é um dos principais poetas árcades brasileiros. Para o
crítico José Aderaldo Castello, em sua obra “ressalta-se, em
primeiro plano, a atitude de transição assumida pelo poeta entre o
espírito servil e bajulador e o espírito independente dos autores
da literatura brasileira colonial, em relação aos mandatários e
poderosos de Portugal.”
Principais
obras:
-
A
Gruta Americana
-
A José Basílio da Gama
Termindo Sipílio
Num vale estreito o pátrio rio desce,
De altíssimos rochedos despenhado
Com ruído, que as feras ensurdece.
Aqui na vasta gruta sossegado
O velho pai das ninfas tutelares
Vi sobre urna musgosa recostado;
Pedaços d'ouro bruto nos altares
Nascem por entre as pedras preciosas,
Que o céu quis derramar nestes lugares.
Os braços dão as árvores frondosas
Em curvo anfiteatro onde respiram
No ardor da sesta as dríades formosas.
Os faunos petulantes, que deliram
Chorando o ingrato amor, que os atormenta,
De tronco em tronco nestes bosques giram.
Mas que soberbo carro se apresenta!
Tigres e antas, fortíssima Amazona
Rege do alto lugar em que se assenta.
Prostrado aos pés da intrépida matrona,
Verde, escamoso jacaré se humilha,
Anfíbio habitador da ardente zona.
Quem és, do claro céu ínclita filha?
Vistosas penas de diversas cores
Vestem e adornam tanta maravilha.
Nova grinalda os gênios e os amores
Lhe oferecem e espalham sobre a terra
Rubins, safiras, pérolas e flores.
-
O Beija-Flor - Rondó VII
Deixo,
ó Glaura, a triste lida
Submergida em doce calma;
E a minha alma ao bem se entrega,
Que lhe nega o teu rigor.
Neste bosque alegre e rindo
Sou amante afortunado;
E desejo ser mudado
No mais lindo Beija-flor.
Todo o corpo num instante
Se atenua, exala e perde:
É já de oiro, prata e verde
A brilhante e nova cor.
Deixo, ó Glaura, a triste lida
Submergida em doce calma;
E a minha alma ao bem se entrega,
Que lhe nega o teu rigor.
Vejo as penas e a figura,
Provo as asas, dando giros;
Acompanham-me os suspiros,
E a ternura do Pastor.
E num vôo feliz ave
Chego intrépido até onde
Riso e pérolas esconde
O suave e puro Amor.
Deixo, ó Glaura, a triste lida
Submergida em doce calma;
E a minha alma ao bem se entrega,
Que lhe nega o teu rigor.
Toco o néctar precioso,
Que a mortais não se permite;
É o insulto sem limite,
Mas ditoso o meu ardor;
Já me chamas atrevido,
Já me prendes no regaço:
Não me assusta o terno laço,
É fingido o meu temor.
Deixo, ó Glaura, a triste lida
Submergida em doce calma;
E a minha alma ao bem se entrega,
Que lhe nega o teu rigor.
Se disfarças os meus erros,
E me soltas por piedade,
Não estimo a liberdade,
Busco os ferros por favor.
Não me julgues inocente,
Nem abrandes meu castigo;
Que sou bárbaro inimigo,
Insolente e roubador.
Deixo, ó Glaura, a triste lida
Submergida em doce calma;
E a minha alma ao bem se entrega,
Que lhe nega o teu rigor.
Submergida em doce calma;
E a minha alma ao bem se entrega,
Que lhe nega o teu rigor.
Neste bosque alegre e rindo
Sou amante afortunado;
E desejo ser mudado
No mais lindo Beija-flor.
Todo o corpo num instante
Se atenua, exala e perde:
É já de oiro, prata e verde
A brilhante e nova cor.
Deixo, ó Glaura, a triste lida
Submergida em doce calma;
E a minha alma ao bem se entrega,
Que lhe nega o teu rigor.
Vejo as penas e a figura,
Provo as asas, dando giros;
Acompanham-me os suspiros,
E a ternura do Pastor.
E num vôo feliz ave
Chego intrépido até onde
Riso e pérolas esconde
O suave e puro Amor.
Deixo, ó Glaura, a triste lida
Submergida em doce calma;
E a minha alma ao bem se entrega,
Que lhe nega o teu rigor.
Toco o néctar precioso,
Que a mortais não se permite;
É o insulto sem limite,
Mas ditoso o meu ardor;
Já me chamas atrevido,
Já me prendes no regaço:
Não me assusta o terno laço,
É fingido o meu temor.
Deixo, ó Glaura, a triste lida
Submergida em doce calma;
E a minha alma ao bem se entrega,
Que lhe nega o teu rigor.
Se disfarças os meus erros,
E me soltas por piedade,
Não estimo a liberdade,
Busco os ferros por favor.
Não me julgues inocente,
Nem abrandes meu castigo;
Que sou bárbaro inimigo,
Insolente e roubador.
Deixo, ó Glaura, a triste lida
Submergida em doce calma;
E a minha alma ao bem se entrega,
Que lhe nega o teu rigor.
Analise
dos poemas:
Nos
poemas dele poderemos encontras diversas referências ao bucólico em
trechos como a primeira estrofe toda do poema "A Gruta
Americana", como vales, rios, rochedos.
Vale
mencionar que apesar de o período arcade ser associado a "campo"
e mitologia, refere-se a natureza em geral e a mitologia pois o
arcadismo vem para se contrapor ao barroco, onde a ideia era a
manipulação e a falsificação, teatralização da natureza, dando
uma ideia de domínio sobre ela e no arcadismo o próprio sentimento
do homem se reflete na natureza, ou seja, não há domínio, nem
relação de força, há a mais completa aceitação do natural, ao
ponto do mais intimo do homem (seus sentimentos) se refletirem no
estado da natureza.
Agora
que a analise foi feita, segue-se exemplo de outros momentos em que o
bucólico aparece no poema: A menção de ninfas na segunda estrofe é
algo muito característico do arcadismo pois além de se remeterem a
mitologia, também fazem referencias a entidades campestres. Há no
poema Beija-Flor na terceira estrofe, menções de elementos da
natureza como a flor, pedras preciosas, céu e já na quarta ele
falará do anfiteatro, nas dríades, na quinta a emoção expressa em
um ser mitológico, afetando a natureza ao redor. A sexta estrófe
até a décima, seguirá esse padrão bem comum do período árcade.
Menções a natureza, mitologia e a integração, a ligação do
sentimento e da natureza.
Seu
segundo poema, "O Beija-Flor - Rondó VII" faz uma espécie
de inversão interessante. Ele ainda traz características do árcade
porém ao invés do sentimento modificando a natureza ao redor, ou a
natureza refletindo os sentimentos do personagem, os próprios
sentimentos são descritos como elementos da natureza como por
exemplo "Neste bosque alegre e rindo", do mesmo modo como
poder ser interpretado como o estado de espírito do personagem no
lugar em que ele está, se sujeita também a uma interpretação
menos subjetiva e mais direta, onde o próprio bosque sorri. A
natureza não representando mas apresentando sentimentos. No
Poema beija-flor, aparece a figura do pastor, que é algo muito
característico do bucólico também.
O
poema "A Gruta Americana", o foco está nos elementos da
natureza e na mitologia grega, enquanto que "O Beija-Flor",
nos sentimentos remetidos a sua amada.
Crítica:
O
Arcadismo, também conhecido como Setecentismo ou Neoclacissismo, é
o movimento que compreende a produção literária brasileira na
segunda metade do século XVIII. O nome faz referência à Arcádia,
região do sul da Grécia que, por sua vez, foi nomeada em referência
ao semideus Arcas (filho de Zeus e Calisto).
Denota-se,
logo de início, as referências à mitologia grega que perpassa o
movimento.
Profundas
mudanças no contexto histórico mundial caracterizam o período,
tais como a ascensão do Iluminismo, que pressupunha o racionalismo,
o progresso e as ciências. Na América do Norte, ocorre a
Independência dos Estados Unidos, em 1776, abrindo caminho para
vários movimentos de independência ao longo de toda a América,
como foi o caso do Brasil, que presenciou inúmeras revoluções e
inconfidências até a chegada da Família Real em 1808.
O
movimento tem características reformistas, pois seu intuito era o de
dar novos ares às artes e ao ensino, aos hábitos e atitudes da
época. A aristocracia em declínio viu sua riqueza esvair-se e dar
lugar a uma nova organização econômica liderada pelo pensamento
burguês.
Ao
passo que os textos produzidos no período convencionado de
Quinhentismo sofreram influência direta de Portugal e aqueles
produzidos durante o Barroco, da cultura espanhola, os do Arcadismo,
por sua vez, foram influenciados pela cultura francesa devido aos
acontecimentos movidos pela burguesia que sacudiram toda a Europa (e
o mundo Ocidental).
Segundo
o crítico Alfredo Bosi em seu livro História Concisa da
Literatura Brasileira (São Paulo: editora Cultrix, 2006) houve
dois momentos do Arcadismo no Brasil:
a)
poético: retorno à tradição clássica com a utilização
dos seus modelos, e valorização da natureza e da mitologia.
b)
ideológico: influenciados pela filosofia presente no
Iluminismo, que traduz a crítica da burguesia culta aos abusos da
nobreza e do clero.
Último
dos neoclássicos de relêvo, autor de uma Epístolaa Basílio da
Gama forrada de preceitos horacianos, Silva Alvarenga já foi
considerado, no entanto, "o elo que prende os árcades e os
românticos" ( Ronald de Carvallzo ). A expressão trai uma
crítica externa, se não superficial: o fato de se incluírem nos
rondós nomes de árvores brasileiras, o cajueiro e a mangueira a
cuja sombra repousa Glaura, além de não ser traço exclusivo do
poeta, pode explicar-se como simples nativismo de paisagem, comum a
barrocos e árcades. E o ameninamento das comparações ( com pombos
e beija-flôres ) e dos adjetivos ( ternos Amores, tenra flor,
púrpura mimosa, mimosa Glaura ) tem um quê de Metastásio dengoso e
acariocado que se entende à maravilha quando se evoca o tipo do
mestiço culto nos tempos coloniais, não se fazendo mister a
etiqueta "romântico" para defini-lo.
Principais
características do arcadismo:
-
inspiração nos modelos clássicos greco-latinos e renascentistas,
como por exemplo, em O
Uraguai
(gênero épico), em Marília
de Dirceu
(gênero lírico) e em Cartas
Chilenas
(gênero satírico);
-
influência da filosofia francesa;
-
mitologia pagã como elemento estético;
-
o bom
selvagem,
expressão do filósofo Jean-Jacques Rousseau, denota a pureza dos
nativos da terra fazem menção à natureza e à busca pela vida
simples, bucólica e pastoril;
-
tensão entre o burguês culto, da cidade, contra a aristocracia;
-
pastoralismo: poetas simples e humildes;
-
bucolismo: busca pelos valores da natureza;
-
nativismo: referências à terra e ao mundo natural;
-
tom confessional;
-
estado de espírito de espontaneidade dos sentimentos;
-
exaltação da pureza, da ingenuidade e da beleza.
Termos
em latim
O
uso de expressões em latim era comum no neoclacisssimo. Elas estavam
associados ao estilo de vida simples e bucólico. Conheça algumas
delas:
Inutilia
truncat:
"cortar o inútil", referência aos excessos cometidos
pelas obras do barroco. No arcadismo, os poetas primavam pela
simplicidade.
Fugere
urbem:
"fugir da cidade", do escritor clássico Horácio;
Locus
amoenus: "lugar
ameno", um refúgio ameno em detrimento dos centros urbanos
monárquicos;
Carpe
diem:
"aproveitar a vida", o pastor, ciente da efemeridade do
tempo, convida sua amada a aproveitar o momento presente.
Cabe
ressaltar, no entanto, que os membros da Arcádia eram todos
burgueses e habitantes dos centros urbanos. Por isso a eles são
atribuídos um fingimento
poético,
isto é, a simulação de sentimentos fictícios.
Bibliografia
de Silva Alvarenga:
Sua
obra poética constitui-se dos livros O Desertor (1774), O Templo de
Netuno (1777), A Gruta Americana (1779), Às Artes (1778) e, o mais
famoso, Glaura (1799).
História
Concisa da Literatura Brasileira, de Alfredo Bosi
http://www.soliteratura.com.br/arcadismo/